Etiologia

A doença celíaca é uma doença autoimune sistêmica desencadeada por peptídeos do glúten a partir de grãos que incluem trigo, centeio e cevada. Quase todas as pessoas com doença celíaca têm uma das duas moléculas do complexo principal de histocompatibilidade de classe II (antígeno leucocitário humano [HLA] DQ2 ou DQ8) necessárias para apresentar peptídeos do glúten de forma que ative uma resposta das células T contra antígenos específicos. A exigência de DQ2 ou DQ8 é um fator importante na predisposição genética para a doença celíaca.[15][16] No entanto, a maioria das pessoas positivas para DQ2 ou DQ8 nunca desenvolve doença celíaca apesar da exposição alimentar diária ao glúten.

Os fatores ambientais ou genéticos adicionais necessários para a perda da tolerância imunológica ao glúten alimentar são desconhecidos. Os fatores que hipoteticamente desempenham um papel são: o momento da exposição inicial ao glúten; infecção gastrointestinal mimetizando antígenos do glúten; ou dano direto à barreira epitelial intestinal causando exposição anormal da mucosa aos peptídeos do glúten. Um grande estudo prospectivo de coorte ao nascimento realizado com crianças com genótipos de HLA DQ2 e DQ8 constatou que uma ingestão maior de glúten nos primeiros 5 anos de vida esteve associada a aumento do risco de doença celíaca. O risco de doença celíaca aumentou com cada 1g/dia adicional de glúten em relação ao valor de referência.[17]​ Estudos de coorte adicionais também encontraram uma associação entre a quantidade de ingestão de glúten com pouca idade e o desenvolvimento subsequente de doença celíaca.[18][19]

Alterações microbianas intestinais estão associadas à doença celíaca e podem preceder o início da enteropatia.[20][21] A infecção por reovírus mostrou promover imunidade inflamatória e diminuição da tolerância oral ao glúten.[22] De acordo com a hipótese de infecção viral como fator desencadeante ambiental da doença celíaca, estudos tipo caso-controle relataram associações entre infecções prévias por enterovírus e parechovírus durante a primeira infância e desenvolvimento posterior de doença celíaca em crianças com risco genético.[23][24]

Fisiopatologia

A perda da tolerância imunológica aos antígenos do peptídeo derivado de prolaminas no trigo (gliadina), centeio (secalina), cevada (hordeína), e grãos relacionados é a principal anormalidade da doença celíaca. Esses peptídeos são resistentes às proteases humanas, permitindo-lhes que se mantenham intactos no lúmen do intestino delgado.[25] Não se sabe como esses peptídeos têm acesso à lâmina própria, mas as principais hipóteses incluem falhas nas junções íntimas, transcitose de células endoteliais, amostragem do lúmen intestinal por células dendríticas e passagem durante a reabsorção dos enterócitos vilosos apoptóticos.

Na submucosa intestinal, esses peptídeos desencadeiam a ativação imunológica inata e adaptativa. O mecanismo de ativação imunológica inata não é totalmente conhecido. Os peptídeos de glúten são claramente capazes de estimular a produção de interleucina-15 por células dendríticas, macrófagos e células epiteliais intestinais, que em seguida estimulam os linfócitos intraepiteliais causando danos epiteliais.[26][27][28][29] Na submucosa, peptídeos de glúten são desamidados pela transglutaminase tecidual (tTG), uma enzima geralmente envolvida na ligação cruzada do colágeno e remodelação tecidual. A desamidação do peptídeo de gliadina permite, em primeiro lugar, a ligação de alta afinidade aos peptídeos do antígeno leucocitário humano (HLA) associados à doença celíaca (DQ2 ou DQ8) encontrados nas células apresentadoras de antígeno, e em segundo lugar, a ativação de células T helper (Th).[30] Por essa razão, as pessoas precisam apresentar HLA- DQ2 (95% dos pacientes com doença celíaca) ou HLA-DQ8 (5% dos pacientes com doença celíaca) para desenvolver a doença celíaca. A estimulação das células Th tem duas consequências. A morte celular e a remodelação do tecido com atrofia vilosa e hiperplasia de criptas são induzidas pelos linfócitos T citotóxicos. O Th2 desencadeia a maturação dos plasmócitos e subsequente produção de anticorpos anti-tTG e antigliadina.[31]

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