Resumo
Definições
O coma é a ausência de consciência.
Esse estado de inconsciência sem despertar inclui a incapacidade de abrir os olhos mesmo diante de estímulo, a ausência de resposta motora ainda que em forma de movimentos de supressão e a falta de uma resposta verbal que vá além da simples emissão de sons incompreensíveis. Isso pressupõe que as vias e os sistemas motores que permitem que um paciente consciente responda estejam intactos.[1]Posner JB, Saper CB, Schiff ND, et al. Psychogenic unresponsiveness. Plum and Posner's diagnosis of stupor and coma. New York, NY: Oxford University Press; 2007.[2]Wijdicks EFM. The comatose patient. New York, NY: Oxford University Press; 2007.[3]Young GB, Wijdicks EFM, eds. Disorders of consciousness. Volume 90. The Handbook of Clinical Neurology, 3rd series. New York, NY: Elsevier; 2008.
A consciência plena é um estado de vigília em que se tem consciência de si e do ambiente, incluindo a capacidade de perceber e interpretar os estímulos e de interagir e se comunicar com os outros na ausência de déficits motores.
O estado de alerta e vigília básicos é uma função do sistema de ativação reticular ascendente (SARA).
A consciência é mais complexa e pouco compreendida. Ela tem várias hierarquias (a mais alta, provavelmente, sendo a autoconsciência e apercepção) e componentes (por exemplo, percepção, memória, atenção, linguagem e outros códigos simbólicos, emoção, motivação, seleção de resposta). Acredita-se agora que esses componentes de consciência e a consciência plena em si se relacionam à ação integrada das redes de regiões corticais cerebrais.[4]Sporns O. Structure and function of complex brain networks. Dialogues Clin Neurosci. 2013 Sep;15(3):247-62. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC3811098 http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/24174898?tool=bestpractice.com Na avaliação da consciência plena, a escala revisada de recuperação de coma (Coma Recovery Scale-Revised; CRS-R) é útil para avaliar e rastrear o nível de consciência.[5]Bodien YG, Carlowicz CA, Chatelle C, et al. Sensitivity and specificity of the coma recovery scale--revised total score in detection of conscious awareness. Arch Phys Med Rehabil. 2016 Mar;97(3):490-492.e1. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/26342571?tool=bestpractice.com
Morte cerebral
Destruição total e irreversível de todas as funções do tronco encefálico, incluindo a capacidade de atenção, funções de nervos cranianos e apneia (Reino Unido), ou todas as funções do cérebro (morte cerebral total nos EUA).
Existem diretrizes revisadas para a determinação neurológica da morte em recém-nascidos e crianças.[6]Nakagawa TA, Ashwal S, Mathur M, et al. Guidelines for the determination of brain death in infants and children: an update of the 1987 task force recommendations-executive summary. Ann Neurol. 2012 Apr;71(4):573-85. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/22522447?tool=bestpractice.com
A morte cerebral nunca deve ser diagnosticada sem uma etiologia.
Estado vegetativo (EV)
Perda completa da consciência com ciclos preservados de vigília e vigília-sono. A função tálamo-cortical foi fortemente perturbada. O EV é comumente devido à lesão cortical cerebral grave (geralmente por anoxia-isquemia após a parada cardíaca ou menos comumente por hipoglicemia), por danos na substância branca do cérebro (mais comumente relacionada à lesão axonal difusa de lesão cerebral traumática) ou danos ao tálamo (por anoxia-isquemia ou lesões estruturais, tais como tumores ou acidentes vasculares cerebrais [AVCs]).
Estado minimamente consciente
A preservação de um ou muito poucos elementos da consciência: por exemplo, comportamentalmente fixando ou seguindo com os olhos e tentando alcançar propositadamente um objeto.
Delirium
Aspecto mais isolado/focal de diminuição da consciência em que a atenção ou a seleção e manutenção de concentração mental é a característica fundamental.
Alerta/vigília preservado em grande medida.
Síndrome da negligência
Aspecto mais isolado/focal de diminuição da consciência mais comumente observado com lesões no lobo parietal não dominante ou córtex pré-frontal.
Alerta/vigília preservado em grande medida.
Encefalopatia
Perturbação da função cerebral difusa, na ausência de inflamação ostensiva do parênquima ou anormalidade estrutural.
Existem numerosas encefalopatias devido às perturbações de eletrólitos, perturbações da função tireoidiana, erros inatos do metabolismo (por exemplo, porfiria, doenças mitocondriais), insuficiência de órgãos (por exemplo, a encefalopatia hepática), inflamação sistêmica (por exemplo, devido a queimaduras), e parada cardíaca (encefalopatia anóxica-isquêmica). A maioria desses causa disfunção funcional reversível da SARA e causa uma perturbação mais difusa sem sinais localizadores.
Lesão de massa
Inclui abscesso cerebral, tumor, hemorragia intracerebral e trauma com hematoma epidural ou subdural.
Dependendo da mistura de casos, lesões de massa causando coma são comuns, especialmente em centros com pacientes com trauma, câncer ou AVC, e até mesmo em hospitais gerais.
É importante reconhecer fases iniciais de síndromes de hérnia (causadas por alterações das estruturas cerebrais e de um compartimento para outro), investigar e tratar antes que ocorram danos irreversíveis. A consciência é prejudicada devido à compressão dos componentes do SARA.
Na hérnia subfalcial, as estruturas da linha média do espaço supratentorial são deslocadas lateralmente, fazendo pressão sobre o tálamo e causando diminuição progressiva da consciência, com ou sem hemiparesia e paralisia do oculomotor em estágios posteriores.
Com a herniação transtentorial há um deslocamento para baixo do uncus (hérnia uncal) ou estruturas diencefálicas (tálamo e hipotálamo) através da abertura tentorial. Isso causa a compressão do tronco encefálico com manifestação inicial de paralisia do oculomotor, geralmente antes da perda de consciência.
A hérnia tonsilar através do forame magno comprime o centro respiratório medular caudal, causando parada respiratória e morte cerebral.
A hérnia central (diencefálica) é considerada comum. A compressão mesencefálica produz paralisias oculomotores bilaterais irreversíveis em estágios posteriores.
A deterioração rostrocaudal da função cerebral ocorre com a distorção do tronco encefálico afetando a perfusão microvascular do tecido. A perda de consciência é tipicamente abrupta com paralisia dos nervos cranianos.
Distúrbios imitando comas
O estado de deaferentação (locked-in) é quando a consciência está preservada, mas o desempenho motor é prejudicado (por exemplo, devido às lesões basis pontis, polineuropatias graves, como a síndrome de Guillain-Barré, paralisia farmacológica).
A apatia psicogênica está relacionada à falta de resposta por causas psicogênicas, na ausência de qualquer lesão tóxica, metabólica, inflamatória ou estrutural no cérebro (por exemplo, pseudocoma, pseudoconvulsão e convulsões psicogênicas).
Coma transitório
A síncope (desmaio) é um coma transitório devido à redução temporária da perfusão cerebral global, que pode ser devido a etiologias cardíacas, etiologias vasomotoras, hipotensão ortostática ou embolia pulmonar.
Convulsões produzem um coma transitório devido às descargas epileptiformes no cérebro, quer como convulsões de ausência/pequeno mal (envolvimento cortical e tálamo bifrontal ou difuso), crises parciais complexas (geralmente originárias do lobo temporal, associadas com envolvimento límbico difuso e inibição cortical cerebral) ou crises convulsivas generalizadas (com descargas de convulsão envolvendo ambos hemisférios cerebrais e estruturas do tronco encefálico). O coma pode ser prolongado em estado de mal epiléptico (por exemplo, estado de mal epiléptico não convulsivo conforme diagnosticado por eletroencefalograma [EEG]). Podem ocorrer movimentos convulsivos e incontinência, especialmente com crises tônico-clônicas generalizadas.
Concussão é a perda transitória da consciência depois de um golpe na cabeça.
Fisiopatologia
Alerta ou excitação é uma função do sistema de ativação reticular ascendente (SARA). Excitação até a vigília é um pré-requisito para a consciência. Esse sistema de excitação está anatomicamente representado por várias estruturas no tegmento do tronco encefálico rostral, diencéfalo e projeções do córtex cerebral.[7]Vincent SR. The ascending reticular activating system - from aminergic neurons to nitric oxide. J Chem Neuroanat. 2000 Feb;18(1-2):23-30. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/10708916?tool=bestpractice.com Entre essas, encontram-se principalmente neurônios produtores de acetilcolina no tronco encefálico rostral. Esses projetam-se rostralmente em 2 vias principais que também contribuem para a excitação cortical:[7]Vincent SR. The ascending reticular activating system - from aminergic neurons to nitric oxide. J Chem Neuroanat. 2000 Feb;18(1-2):23-30. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/10708916?tool=bestpractice.com
Uma via dorsal que realiza uma sinapse com a linha média e núcleos inespecíficos do tálamo, os quais em seguida, enviam uma projeção glutaminérgica para grandes áreas do córtex cerebral
Uma via ventral do tegmento do tronco encefálico rostral que atinge o prosencéfalo basal, especialmente no hipotálamo posterior, onde terminais do axônio agem sobre os neurônios que sintetizam histamina, hipocretina ou orexina.
O SARA é um sistema complexo, com alguma redundância das vias que estão envolvidas na excitação e manutenção da vigília. Isso pode explicar a recuperação do sistema de excitação após um coma inicial, quase sempre no prazo de 3 semanas a partir do início do coma na maioria dos pacientes. Como corolário, os transtornos causam diminuição da consciência ao prejudicar a função de um componente significativo do SARA.
Epidemiologia
Apesar de episódios transitórios de perda de consciência (por exemplo, desmaio e convulsão) serem comuns e representarem cerca de 5% das visitas aos pronto-socorros, as consultas hospitalares por coma constituem apenas 0.02% das internações na Inglaterra.[8]Department of Health. Hospital Episode Statistics (England). 2002-2003 [internet publication]. http://www.hscic.gov.uk/hes Homens e mulheres adultos são quase igualmente afetados. A média de idade é de 57 anos, embora >35% dos pacientes com coma tenham mais de 75 anos de idade.[8]Department of Health. Hospital Episode Statistics (England). 2002-2003 [internet publication]. http://www.hscic.gov.uk/hes
Prevenção e manejo
O manejo inicial inclui o controle das vias aéreas, da respiração e do suporte circulatório (ABC). Em pacientes sem resposta clínica, a proteção das vias aéreas é fundamental.[9]Matthes G, Bernhard M, Kanz KG, et al. Emergency anesthesia, airway management and ventilation in major trauma. Background and key messages of the interdisciplinary S3 guidelines for major trauma patients [in German]. Unfallchirurg. 2012 Mar;115(3):251-64. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/22406918?tool=bestpractice.com
As ferramentas de avaliação clínica para pacientes com diminuição da consciência incluem a escala de coma de Glasgow e o escore Full Outline of UnResponsiveness (FOUR), o qual apresenta algumas vantagens para pacientes intubados.[10]Bruno MA, Ledoux D, Lambermont B, et al. Comparison of the Full Outline of UnResponsiveness and Glasgow Liege Scale/Glasgow Coma Scale in an intensive care unit population. Neurocrit Care. 2011 Dec;15(3):447-53. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/21526394?tool=bestpractice.com
Diretrizes e análises têm embasado a prevenção e o manejo do AVC isquêmico, da hemorragia subaracnoide, da hemorragia intracerebral e do trauma.[11]Meschia JF, Bushnell C, Boden-Albala B, et al; American Heart Association Stroke Council; Council on Cardiovascular and Stroke Nursing; Council on Clinical Cardiology; Council on Functional Genomics and Translational Biology; Council on Hypertension. Guidelines for the primary prevention of stroke: a statement for healthcare professionals from the American Heart Association/American Stroke Association. Stroke. 2014 Dec;45(12):3754-832. http://stroke.ahajournals.org/content/45/12/3754.long http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/25355838?tool=bestpractice.com [12]Lansberg MG, Bluhmki E, Thijs VN. Efficacy and safety of tissue plasminogen activator 3 to 4.5 hours after acute ischemic stroke: a metaanalysis. Stroke. 2009 Jul;40(7):2438-41. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/19478213?tool=bestpractice.com [13]Connolly ES Jr, Rabinstein AA, Carhuapoma JR, et al; American Heart Association Stroke Council; Council on Cardiovascular Radiology and Intervention; Council on Cardiovascular Nursing; Council on Cardiovascular Surgery and Anesthesia; Council on Clinical Cardiology. Guidelines for the management of aneurysmal subarachnoid hemorrhage: a guideline for healthcare professionals from the American Heart Association/American Stroke Association. Stroke. 2012 Jun;43(6):1711-37. http://stroke.ahajournals.org/content/43/6/1711.long http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/22556195?tool=bestpractice.com [14]Greenberg SM, Ziai WC, Cordonnier C, et al. 2022 Guideline for the management of patients with spontaneous intracerebral hemorrhage: a guideline from the American Heart Association/American Stroke Association. Stroke. 2022 Jul;53(7):e282-e361. https://www.ahajournals.org/doi/abs/10.1161/STR.0000000000000407 http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/35579034?tool=bestpractice.com [15]Steiner T, Al-Shahi Salman R, Beer R, et al; European Stroke Organisation. European Stroke Organisation (ESO) guidelines for the management of spontaneous intracerebral hemorrhage. Int J Stroke. 2014 Oct;9(7):840-55. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/25156220?tool=bestpractice.com [16]Pandor A, Harnan S, Goodacre S, et al. Diagnostic accuracy of clinical characteristics for identifying CT abnormality after minor brain injury: a systematic review and meta-analysis. J Neurotrauma. 2012 Mar 20;29(5):707-18. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/21806474?tool=bestpractice.com [17]Kim YJ. A systematic review of factors contributing to outcomes in patients with traumatic brain injury. J Clin Nurs. 2011 Jun;20(11-12):1518-32. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/21453293?tool=bestpractice.com O uso da estimulação farmacológica e elétrica em casos de estados vegetativos e minimamente conscientes permanece controverso.[18]Oliveira L, Fregni F. Pharmacological and electrical stimulation in chronic disorders of consciousness: new insights and future directions. Brain Inj. 2011;25(4):315-27. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/21314279?tool=bestpractice.com
Diagnósticos diferenciais
comuns
- Acidente vascular cerebral (AVC)
- Parada cardíaca
- Encefalopatia hipertensiva
- Trombose da artéria basilar
- Trombose venosa cerebral
- Abuso de álcool
- Abuso de substâncias e overdose
- Intoxicação por monóxido de carbono
- Encefalopatia associada com sepse
- Meningite bacteriana
- Síncope
- Transtorno convulsivo
- Lesão cerebral traumática
- Hipoglicemia
- Hiperglicemia
- Encefalopatia hepática
- Hiponatremia
- Hipotireoidismo
- Encefalopatia de Wernicke
- Hipofosfatemia
Incomuns
- Hemorragia subaracnoide
- Encefalite
- Abscesso cerebral
- Tumor cerebral
- Hipernatremia
- Hipercalcemia
- Hipocalcemia
- Hipermagnesemia
- Hipomagnesemia
- Porfiria
- Distúrbio mitocondrial
- Tempestade tireoidiana
- Queimaduras
- Hipertermia
- Hipotermia
- Apatia psicogênica
- Estado de deaferentação
Colaboradores
Autores
G. Bryan Young, MD, FRCPC

Professor of Neurology
University of Western Ontario
ON
Canada
Declarações
GBY declares that he has no competing interests.
Revisores
Paul Vespa, MD
Professor of Neurology and Neurosurgery
Director of Neurocritical Care
David Geffen School of Medicine at University of California
LA
Declarações
PV declares that he has no competing interests.
Steven Laureys, MD, PhD
Department of Neurology
Liege University Hospital
Head
Coma Science Group
Senior Research Associate
Belgian National Funds for Scientific Research
Cyclotron Research Centre
University of Liege
Belgium
Declarações
SL declares that he has no competing interests.
Diretrizes
- Head injury: assessment and early management
- Practice guideline summary: reducing brain injury following cardiopulmonary resuscitation
DiretrizesFolhetos informativos para os pacientes
Ataque cardíaco: o que é?
O que você pode fazer para evitar outro ataque cardíaco
Mais Folhetos informativos para os pacientesCalculadoras
Escala de coma de Glasgow
Mais CalculadorasConectar-se ou assinar para acessar todo o BMJ Best Practice
O uso deste conteúdo está sujeito ao nosso aviso legal