Abordagem

O padrão de assistência para o tratamento da apendicite não complicada em adultos continua sendo cirúrgico.

Há evidências emergentes que sugerem que uma abordagem não cirúrgica, apenas com antibióticos, pode ser viável em populações selecionadas de pacientes, que desejam evitar a cirurgia e que aceitam o risco de recorrência de até 39%.[80]​ Nesses casos, recomenda-se que o diagnóstico de apendicite não complicada seja confirmado por um exame de imagem, e que as expectativas do paciente sejam administradas por um processo de tomada de decisão compartilhada.[7][81][82][83]​​ As evidências que apoiam o tratamento não cirúrgico da apendicite continuam conflitantes, e são necessárias pesquisas adicionais.[84][85][86][87]​​​ Há mais evidências para dar suporte a uma abordagem não cirúrgica nas crianças que nos adultos.[7][81][82][88][89][90][91][92]​​[93]

Quadro não complicado

Uma vez feito o diagnóstico de apendicite aguda, não se deve administrar nada por via oral aos pacientes.

A fluidoterapia intravenosa deve ser iniciada.

Adultos

A apendicectomia imediata continua sendo o tratamento de primeira escolha nas diretrizes internacionais, e deve ser recomendada na maioria dos casos. Uma dose única pré-operatória de um antibiótico de amplo espectro, como ceftriaxona ou cefotaxima associada a metronidazol, deve ser administrada aos pacientes com apendicite não complicada submetidos a apendicectomia.[7][83][94]​ Uma alternativa é a cefotetana associada a metronidazol.[7]​ Nos pacientes com alergia a betalactâmicos ou contraindicação a esses esquemas, pode-se usar ciprofloxacino ou levofloxacino associados a metronidazol.[7][83][94] Antibióticos pós-operatórios não são indicados.[7][83] A cefotetana é uma opção menos desejável devido à crescente resistência das bactérias anaeróbias a este agente e à possível diminuição da eficácia.[7][83][94]​​​

Uma abordagem baseada apenas em antibióticos pode ser razoável para determinados grupos com apendicite não complicada (suspeitada ou confirmada à tomografia computadorizada), em que os pacientes entendem o risco da apendicite recorrente.[7][80][85]​​​​​[81][82] Neste cenário, a antibioticoterapia inicial deve ser com um esquema de antibioticoterapia de amplo espectro, como ceftriaxona, cefotaxima, cefepima ou ceftazidima associada a metronidazol.​​​​​​​[7][83][94]​​​​Piperacilina/tazobactam também é uma opção.[94][83]​ Ciprofloxacino ou levofloxacino associados a metronidazol podem ser usados se os betalactâmicos forem contraindicados.​​​​​[7][83][94] Nos pacientes com risco de infecção por organismos resistentes a antimicrobianos, as opções incluem ertapeném, imipeném/cilastatina, meropeném ou aztreonam associado a vancomicina e metronidazol.[7][83][94] Após uma melhora clínica em 1 a 2 dias, os antibióticos podem ser trocados para um esquema oral para completar uma duração total de 7 a 10 dias. As opções orais incluem ciprofloxacino ou levofloxacino associados a metronidazol, ou amoxicilina/ácido clavulânico (se as taxas locais de resistência da E.Coli forem <10%).[7][83][94]​ Uma abordagem baseada apenas em antibióticos não é recomendada se houver apendicolito, pois o tratamento não cirúrgico tem uma taxa de fracassos significativa.[2][7][95]​​​​​ A abordagem conservadora deve ser evitada nas pacientes gestantes.[7]

Os antibióticos fluoroquinolonas sistêmicos (por exemplo, ciprofloxacino, levofloxacino) podem causar eventos adversos graves, incapacitantes e potencialmente duradouros ou irreversíveis. Isso inclui, mas não está limitado a: tendinopatia/ruptura de tendão; neuropatia periférica; artropatia/artralgia; aneurisma e dissecção da aorta; regurgitação da valva cardíaca; disglicemia; e efeitos sobre o sistema nervoso central, incluindo convulsões, depressão, psicose e pensamentos e comportamento suicidas.[96]

  • Aplicam-se restrições de prescrição ao uso das fluoroquinolonas, e essas restrições podem variar entre os países. Em geral, o uso das fluoroquinolonas deve ser restrito para o uso nas infecções bacterianas graves e com risco à vida, somente. Algumas agências regulatórias também podem recomendar que elas sejam usadas apenas nas situações em que outros antibióticos comumente recomendados para a infecção forem inadequados (por exemplo, resistência, contraindicações, falha do tratamento e indisponibilidade).

  • Consulte as diretrizes locais e o formulário de medicamentos para obter mais informações sobre adequação, contraindicações e precauções.

​Crianças

Orientações da World Society of Emergency Surgery dão suporte ao tratamento não cirúrgico como opção viável, segura e eficaz como tratamento inicial, a menos que haja presença de apendicolito.[2][7]​​​ No entanto, nos EUA, o padrão de assistência habitual para o tratamento da apendicite não complicada nas crianças continua sendo cirúrgico.

Antimicrobianos parenterais ativos contra bactérias aeróbias Gram-negativas e anaeróbias devem ser iniciados assim que o diagnóstico de provável apendicite for estabelecido. As opções incluem ceftriaxona associada a metronidazol, piperacilina/tazobactam ou ciprofloxacino associado a metronidazol, todos em dose única no momento da cirurgia.[7][83][94] Os antibióticos pós-operatórios não são indicados nas crianças com apendicite aguda não complicada, pois não há evidências de que eles diminuam a taxa de infecção cirúrgica.[7][83][94]

A apendicectomia não deve ser protelada por mais de 24 horas após a internação para as crianças com apendicite aguda não complicada que requeiram cirurgia.[7] A cirurgia realizada neste prazo não está associada a aumento do risco de desfechos adversos, como perfuração, complicações ou tempo de cirurgia nas crianças que recebem a administração oportuna de antibióticos e são submetidas a apendicectomia menos de 24 horas após o diagnóstico.[7]

Assim como ocorre com os adultos, a cirurgia é recomendada nas crianças com apendicolito, pois a taxa de fracassos do tratamento não cirúrgico aumenta nesses casos.​[2][7] Contudo, nas crianças sem apendicolito e com baixo risco de perfuração, uma abordagem com antibióticos, somente, pode ser considerada. Neste cenário, a antibioticoterapia inicial deve ser com um esquema de antibioticoterapia de amplo espectro, como ceftriaxona ou cefotaxima associadas a metronidazol.​[7][83][94]​ Piperacilina/tazobactam também é uma opção.[83][94]​ O ciprofloxacino associado a metronidazol pode ser usado se os betalactâmicos forem contraindicados.[83][94] Nos pacientes com risco de infecção por organismos resistentes a antimicrobianos, as opções de antibióticos incluem o ertapeném, imipeném/cilastatina ou meropeném.​[7][83][94] Após uma melhora clínica em 1 a 2 dias, os antibióticos podem ser trocados por um esquema oral para completar uma duração total de 7 a 10 dias. As opções orais incluem amoxicilina/ácido clavulânico ou ciprofloxacino associado a metronidazol.[7][83][94]

Quadro complicado

Adultos

As complicações da apendicite aguda ocorrem em 4% a 6% dos adultos e incluem gangrena com perfuração subsequente ou abscesso intra-abdominal.[21]

O manejo inicial inclui manter o paciente sem tomar nada por via oral e iniciar fluidoterapia intravenosa. Os pacientes que estão em choque devem receber um bolus de fluidoterapia intravenosa para ajudar a manter uma frequência de pulso e PA estáveis.[97]​​ Consulte Choque.

Os antibióticos intravenosos (por exemplo, ceftriaxona, cefotaxima, cefepima, ceftazidima, ciprofloxacino ou levofloxacino associados a metronidazol; ou ticarcilina/ácido clavulânico ou piperacilina/tazobactam) devem ser iniciados imediatamente e ser mantidos até que o paciente se torne afebril e a leucocitose seja corrigida.[7][83][94]

Para infecções mais graves, pacientes que correm risco de infecção por organismos resistentes a antimicrobianos ou que apresentam infecções associadas aos cuidados de saúde, as opções de antibióticos incluem ertapeném, imipeném/cilastatina, meropeném ou aztreonam associado a vancomicina e metronidazol.[7][83][94]​​ Também se pode usar uma combinação de esquemas de antibioticoterapia com base nas sensibilidades e nos protocolos locais.[21]

Em pacientes com peritonite aguda, é necessário realizar a apendicectomia imediatamente. Os pacientes que apresentarem abscesso no quadrante inferior direito deverão receber antibióticos intravenosos e drenagem por radiologia intervencionista (drenagem guiada por tomografia computadorizada) ou drenagem operatória. Se houver melhora clínica e os sinais e sintomas forem completamente resolvidos, a apendicectomia tardia pode não ser necessária.[7][98][99][100][101]

A apendicectomia tardia é realizada se os sintomas não desaparecerem completamente e/ou se os sintomas recorrerem.[7][13]​​​​ A apendicectomia tardia também é recomendada em todos os pacientes com mais de 30 anos de idade com apendicite complicada inicialmente tratada de forma não cirúrgica; além disso, qualquer paciente com idade ≥40 anos com apendicite não complicada que receba tratamento conservador sem apendicectomia tardia deve ser submetido a rastreamento com colonoscopia e tomografia computadorizada (TC) de dose total com contraste a intervalos regulares.[7][102]​​​​ A apendicectomia tardia também pode ser usada para identificar os pacientes com neoplasia apendicular subjacente; a apendicectomia tardia pode reduzir o risco futuro de neoplasia do apêndice, particularmente no contexto de uma apendicite complicada.[103][104]​​​ O risco de neoplasia do apêndice em pacientes tratados com tratamento não cirúrgico de uma apendicite complicada é de 11%, aumentando para 16% nos pacientes com 50 anos ou mais e 43% nos pacientes com mais de 80 anos​.[102][105]​​[106]

O tratamento ideal para a apendicite com flegmão ou abscesso continua sujeito a debate.[7] As evidências mais recentes sugerem que a apendicectomia laparoscópica está associada a menos reinternações e menos intervenções adicionais que o tratamento conservador, desde que haja expertise avançada para laparoscopia disponível.[7][107]​ O tratamento não cirúrgico com antibióticos e, se disponível, drenagem percutânea guiada por imagem, é uma alternativa razoável se o paciente estiver estável e uma apendicectomia laparoscópica não estiver disponível, embora faltem evidências para seu uso de maneira rotineira.[7]

Crianças

As complicações da apendicite aguda ocorrem em menos de 19% das crianças e incluem gangrena com perfuração subsequente ou abscesso intra-abdominal.[7][107]​ Assim como ocorre com adultos, o manejo inicial inclui manter o paciente em jejum e iniciar fluidoterapia e antibióticos intravenosos. Uma apendicectomia precoce, em até 8 horas, deve ser realizada em caso de apendicite complicada.[7] A apendicectomia laparoscópica é preferível à apendicectomia aberta nas crianças, quando estiverem disponíveis expertise e equipamento para tal.[7][108][109]​​​

As opções de antibióticos incluem a ceftriaxona ou a cefotaxima associadas a metronidazol, ou piperacilina/tazobactam. Nos pacientes com alergia a betalactâmicos ou outras contraindicações aos esquemas anteriores, pode-se usar ciprofloxacino associado a metronidazol.[7][83][94]​ Os antibióticos pós-operatórios por menos de sete dias parecem ser seguros e não estão associados a um aumento do risco de complicações.[83]​ Eles podem ser trocados da forma intravenosa para a oral após 48 horas nas crianças com apendicite complicada, se houver melhora clínica e a contagem leucocitária estiver normalizada, com uma duração global da terapia inferior a sete dias.[7][83][94] As opções de esquemas orais incluem amoxicilina/ácido clavulânico, ou ciprofloxacino associado a metronidazol.​[7][83][94]

Assim como o tratamento de adultos com flegmão ou abscesso, o tratamento não cirúrgico (antibióticos e, se disponível, drenagem percutânea guiada por imagem) é uma alternativa razoável se o paciente estiver estável e uma apendicectomia laparoscópica não estiver disponível.[7] O tratamento não cirúrgico foi associado a melhores resultados, em termos de taxa de complicações e de reinternação em crianças, mas as evidências não apoiam o seu uso rotineiro.[110][111]

Opções cirúrgicas

Há 2 opções cirúrgicas para apendicectomia: aberta e laparoscópica. Atualmente, a maioria dos procedimentos é feita por via laparoscópica.

Em adultos, a escolha da apendicectomia geralmente depende da experiência do cirurgião. Estudos mostraram que a apendicectomia laparoscópica apresenta resultados estéticos melhores, menor duração da internação hospitalar, dor pós-operatória reduzida e menor risco de infecção de feridas, em comparação com a apendicectomia aberta.[112][113]​​ [ Cochrane Clinical Answers logo ] [Evidência B] A apendicectomia laparoscópica é recomendada para apendicite não complicada, bem como para apendicite complicada e perfurada.[114][115] Também é considerada a abordagem mais segura em pacientes obesos.[7][116]

Em crianças, a apendicectomia laparoscópica diminui a incidência de complicações pós-operatórias gerais, incluindo infecção da ferida e a duração total da internação hospitalar.[109][112][117][118]​​[119][120]​​​​ 

Em pacientes gestantes, a apendicectomia laparoscópica deve ser preferível à apendicectomia aberta, quando a cirurgia for indicada e houver expertise para laparoscopia disponível.[121][122]​​​​ Ela é segura em termos dos riscos de perda fetal e de parto prematuro.[121][122]​​ Comparada com a cirurgia por via aberta durante a gestação, a apendicectomia laparoscópica está associada a um período mais curto de internação hospitalar e a uma menor incidência de infecção do sítio cirúrgico. A laparoscopia é tecnicamente segura e viável durante a gestação.[7][121][122][123]


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[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Apendicite aguda - espécime intraoperatórioNasim Ahmed, MBBS, FACS; usado com permissão [Citation ends].com.bmj.content.model.Caption@60f30d21

Terapia apenas com antibióticos

Antibióticos isolados para o tratamento da apendicite não complicada podem ser bem sucedidos em determinados pacientes que desejam evitar a cirurgia e que aceitam o risco de até 39% de recorrência.[80][85]​​ Nesses casos, recomenda-se que o diagnóstico de apendicite não complicada seja confirmado por um exame de imagem, e que as expectativas do paciente sejam administradas por um processo de tomada de decisão compartilhada.[7]​​[81][82][83]

Neste cenário, recomendam-se antibióticos de amplo espectro. Os esquemas recomendados são os mesmos da apresentação não complicada (ver acima).

Uma abordagem baseada apenas em antibióticos não é recomendada para pacientes gestantes ou se houver presença de apendicolito.[2][7][95]

Apendicectomia laparoscópica ambulatorial

Alguns pacientes podem receber alta com segurança após uma apendicectomia laparoscópica sem internação hospitalar.[125]​ Esta abordagem ambulatorial é adequada para os pacientes com apendicite não complicada, desde que uma via ambulatorial com protocolos do programa ERAS (Enhanced Recovery After Surgery) bem definidos e as informações/consentimento do paciente estejam localmente estabelecidos.[7] A implementação do ERAS após a apendicectomia laparoscópica tem taxas similares de morbidade e reinternação, comparada com a assistência convencional.[126] Seus potenciais benefícios incluem recuperação mais rápida após a cirurgia e menores custos hospitalares e sociais.[7]

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